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sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Resenha nº 78 - Por que fazemos o que fazemos? de Mario Sergio Cortella

Resultado de imagem para livro por que fazemos o que fazemosTítulo: Por que fazemos o que fazemos?
Subtítulo: aflições vitais sobre trabalho, carreira e realização
Autor: Mario Sergio Cortella
Editora: Planeta
Edição:3ª
ISBN: 978.85.422.0741-5
Número de páginas:174

Mario Sergio Cortella é por demais conhecido nos meios de comunicação brasileiros. É filósofo, escritor, com mestrado e doutorado em educação e professor-titular da PUC-SP, com docência e pesquisa na Pós-graduação em Educação. Foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo (1991-1992). Foi também Assessor Especial e Chefe de Gabinete do professor Paulo Freire. Exerce atividade como comentarista da Rádio CBN nos programas Academia CBN e Escola da Vida. Tem mais de vinte livros publicados, entre eles, Qual é a tua obra?, Educação, convivência e ética; Educação, Escola e Docência (resenhado neste blog e campeão absolutíssimo de acessos) e Vida e carreira: um equilíbrio possível?, com Pedro Mandelli e Pensar bem nos faz bem!

Este Por que fazemos o que fazemos? é o mais recente trabalho de Cortella. Sobre o que seria esse livro? Basta lermos o subtítulo: “aflições vitais sobre trabalho, carreira e realização. No estilo que lhe é peculiar, Mario Sergio abre o livro, numa espécie de prefácio, com o título “Vida com propósito”:
“Segunda-feira, seis da manhã. “Triiiiiimmmm, triiiiiimmmm...” O despertador do seu celular toca e você não quer sair da cama. E isso pode indicar dois estados de ânimo. Você gostaria de dormir mais um pouquinho. O que é sinal de cansaço. Provavelmente o final de semana foi movimentado, com festas, atividade física, viagem, e você precisaria de mais algumas horas até o corpo se recuperar de um esforço intenso. Se a vontade, no entanto, é de não sair da cama, isso é sinal de estresse. Você não enxerga mais razão para fazer o que faz. ” (página 7)

E o livro faz desfilar diante de nossos olhos uma série de pequenos textos que poderiam muito bem ser enquadrados como crônicas filosóficas (da crônica, herda a linguagem muito direta e descontraída, entre séria e brincalhona; da filosofia, a discussão de problemas éticos e motivacionais). Eis a sequência dos capítulos: 1) A importância do propósito; 2) Eu, robô? Não..., 3) Odeio segunda-feira; 4) Rotina não é monotonia; 5) Autoria da obra; 6) O trabalho que nos molda; 7) A origem da motivação; 8) O que mais desmotiva; 9) Trabalho com significação; 10) Ética do esforço; 11) Valores e propósitos; 12) Por que fazer? E por que não fazer?;13) Tempo, tempo, tempo; 14) Futuros e pretéritos; 15) Eu era feliz e não sabia; 16) Lealdade à empresa até quando?; 17) Desenvolvimento gera envolvimento; 18) Motivação em tempos difíceis; 19) Organizações com propósito; 20) A empresa me sustenta, eu a sustento; ainda, mais dois pequenos textos, fechando o volume: Paciência na turbulência e Sabedoria na travessia.

Quando o livro é bem planejado, ler o índice pode nos dar uma direção segura da estrutura da obra, uma indicação de para onde vai o autor na condução do seu texto.
Por que fazemos o que fazemos é sobre encontrar um significado para aquilo que fazemos, no trabalho ou fora dele, tornando assim, nossas ações ou escolhas significativas para nós. Claramente, a ideia advogada é a de, encontrada uma significação, uma motivação para fazer o que faço, faço-o melhor. E, dono de uma articulação de conhecimentos admirável, Cortella comenta:

“Algumas religiões, entre elas a judaico-cristã, nos falam sobre o Juízo Final, o momento em que uma divindade virá fazer as grandes perguntas para julgar nossa vida, se ela foi uma vida que valeu ou não valeu a pena. As perguntas da divindade supostamente seriam: O que fez, fez por quê? O que não fez, não fez por quê? O que fez e não deveria ter feito, por que o fez? O que não fez e deveria ter feito, por que não o fez? ” (página 11)

Aqui, um comentário. Mario Sergio, declaradamente, não tem uma religião definida. Sem religião definida, mas não tolo. Sabe perfeitamente estar inserido numa forte cultura religiosa, de predominância cristã. Utilizar seus elementos para tornar mais clara uma passagem ou mesmo brincar com ela, como alguém que nos pusesse a mão no ombro e nos dissesse “olha, isso que eu tenho para dizer é importante, preste a atenção” é um recurso de aproximação com o leitor. E torna o texto mais leve; ainda mais um texto filosófico, que tem fama de ser hermético, difícil – chato, mesmo.

Uma vida sem propósito é uma vida pequena. E a praga da procrastinação frequente – palavra difícil – para significar, em última análise, o constante adiar do sonho, acaba sendo um de nossos inimigos internos. “Ah, um dia vou ser escritor”, “um dia saio dessa empresa”. Não tomo qualquer atitude para que tais mudanças aconteçam. Isso é procrastinação.

Cortella faz desfilar de modo descomplicado dizeres de Marx, Nietzsche, Martin Heidegger, Fernando Pessoa, Nicolai Gogol e Jesus, John Milton, autor de O Paraíso perdido, Marcel Proust, escritor de Em busca do tempo perdido. Escutamos a voz grave do autor falando em nossa cabeça, em subvocalização.

No capítulo 10, “A ética dos esforços”, Cortella nos fala sobre um caso acontecido com o pianista Arthur Moreira Lima, em tom de parábola:

“Após um concerto magnífico, um jovem foi até ele e falou: ‘Gostei demais do concerto, eu daria a vida para tocar piano como o senhor. ’ E ele, de pronto, respondeu: ‘Eu dei. Foram quarenta anos de dedicação de nove a dez horas diárias de esforço. ” (página 86)
E aí eu me lembro de uma história emblemática cuja tônica é a espera que algo aconteça. Chama-se A fera na selva, de Henry James, uma dessas pérolas pequenas no tamanho, mas grandes no engenho. É sobre um casal, ainda jovem, que passa a vida inteira aguardando, pois sente que alguma coisa de extraordinário vai acontecer em suas vidas.

Não se iluda o leitor: o texto “simples” de Cortella é, em si, uma demonstração do que pode fazer a motivação, o objetivo. Dono de uma erudição fantástica, nosso Mario Sergio deve ter percebido que uma boa quantidade de textos acadêmicos não se comunica com os não acadêmicos, o público em geral. E fez disto uma de suas plataformas: já que vou produzir textos para todos lerem, devo fazê-lo de modo objetivo, claro, divertido. Há um complexo trabalho de depuração por detrás da apresentação final do texto. A simplicidade é um efeito buscado.


Palmas para o Cortella, que ele merece!

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns aos dois!!!